Silvia Malamud
Em pleno século XXI quando mais do que nunca grande parte das mulheres almeja
estar financeiramente independente, considerandose as facilidades para se divorciar
sem o antigo preconceito que antes rondava este tema, observase que o cenário
parece ser repleto de caminhos facilitadores para que o desenvolvimento da
individualidade se manifeste, mas este, porém, apenas é um lado da moeda. Mesmo
em meio a todas essas evidências, um grito antes silencioso começa a se fazer ouvir.
Milhares de pessoas e em sua maioria mulheres, mas não só, apesar de todas essas
conquistas, permanecem subjugadas e atrás de véus de sofrimento, continuam como
reféns de relacionamentos abusivos, com parceiros que exercem um tipo de sequestro
emocional que rapidamente se transforma em sequestro de alma, quando
estrategicamente roubam das suas vítimas, os seus próprios cenários existenciais. Um
tipo de manipulação perversa em que o cônjuge, filho, funcionário ou o que seja, vai
sequencialmente perdendo referências sobre si mesmo, sobre o que de verdade lhe
faz sentido. São táticas de inserção de uma escravidão velada, onde a vida das
pessoas que entram nessas tramas é literalmente roubada.
A grande pergunta que ronda aqueles que estão de fora seria do porquê muitos,
mesmo quando já estão conscientes da condição em que estão, ainda assim
continuarem a conviver com parceiros manipuladores do tipo sequestrador emocional.
Outra questão seria sobre como nessa atualidade, que visa a independência a
qualquer custo, as pessoas entram nessas situações e por que isso acontece?
Precisamos definir quem são eles e como agem e por que tanto estes tipos como as
vítimas estão em evidência nos dias de hoje.
Quem são eles? Narcisistas perversos, o que são? O que seria um relacionamento
abusivo e prejudicial?
Narcisismo Perverso é uma patologia que se evidencia mais em nossa atualidade
exatamente pelas demandas do nosso século. O narcisista perverso não suporta ver
brilhos fora dele. Qualquer pessoa que esteja por perto, numa relação mais próxima,
ameaça sua frágil percepção de si mesmo. Como o vazio interior é grande, a luz do
outro deve ser apagada imediatamente, mas não em evidência porque ele sabe das leis de boa conduta e precisa, por sua característica narcísica, aparecer bem na fita.
Uma de suas principais armas é a promessa de um relacionamento de fusão, ou seja
de compatibilidade absoluta seja em qual área for. Sendo que isso pode ser na
sexualidade, mas não só. Para tanto, o grau de sedução vai às alturas. Na fase da
sedução, as promessas fazem o colorido das conversas e com isso ele vai descobrindo
o que falta na vítima, onde dói e o que precisa ser suprido. Após a entrega afetiva da
vítima, quando ela cai na ilusão de que suas carências podem ser sanadas, o lado
negro do sedutor narcisista perverso aparece. De uma hora para outra ela passará a
ser criticada, nunca estará suficientemente bom o que se faz e nem como se é e ainda
neste pacote, juntamente com as críticas, uma ameaça sinistra de abandono ficará
incessantemente pairando no ar. As vítimas, uma vez que fisgadas, esquecem-se de
que há pouquíssimo tempo estavam autossuficientes em suas vidas e com o seu brilho
próprio. Aliás, o medo dessas vítimas é o do abandono. Funcionam em sua maioria
como pessoas sociáveis e que têm o costume de agradar aos outros antes mesmo de
ouvirem o que seria de fato bom para elas. Como este receio, agora amplificado pelas
artimanhas do perverso, as vítimas muitas vezes acabam num estado tao regredido,
esquecendo-se de suas conquistas pessoais passando a funcionar com o emocional da
criança temerosa da perda do amor que um dia foram e mesmo aquelas que não
acessam esse lugar de modo consciente, não escapam desses sentimentos de medo
do abandono. Com isso vão funcionando como escravas do olhar dos parceiros,
denegrindo-se, inclusive, tudo em nome de não perderem o afeto, portanto, o
sustento da vida.
A solução para se resolver este impasse são duas, consciência do lugar onde se está
e, na maioria dos caso, auxílio terapêutico para sair dessa fortalecido. Uma
oportunidade de curar feridas emocionais escondidas, mas que gritam alto nas
condutas que se tem na vida.
Existem também outras opções para sobreviver a esse tipo de relacionamento, uma
delas é a alternativa do não contato. Nela a pessoa decide cortar toda forma de
contato. Esse tipo de envolvimento é conhecido como uma espécie de relação tóxica,
sim, como se fosse uma drogadição que para se descontaminar e se desintoxicar
totalmente, é necessário distância absoluta. A necessidade de fusão, quando ainda
não estamos completos em nós mesmos, pode levar a todo tipo de adição.
Por conta da repercussão do meu livro e de tudo o que está ficando em evidência
sobre os relacionamentos nesses tempos, todos os dias recebo pessoa desesperadas,
com total consciência de onde estão, querendo ajuda a todo custo para que possam se
libertar do inferno em que vivem. E as consequências para quem permanece tempo demais podem ser devastadoras. Em meu livro, conto casos reais, romanceados e
redimensionados. Fica evidente como que as pessoas entram nessas roubadas e como
podem acordar e se resgatarem mais amadurecidas depois de tanto sofrimento.
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